sábado, 10 de setembro de 2011

Mistérios Masculinos

 (Retirado dos Livros Mistérios Wiccanos de Raven Grimassi e Wicca, A Religião da Deusa de Claudiney Prieto).
Mistérios Masculinos
“Para os primitivos povos caçadores, os animais selvagens eram manifestações do desconhecido. A fonte de perigo e sobrevivência foi associada psicologicamente à tarefa de compartilhar o mundo silvestre com esses seres. Ocorreu uma identificação inconsciente, que se manifestou nos míticos totens meio humanos, meio animais das antigas tribos. Os animais tornaram-se tutores da humanidade. Através de imitações, as naturezas separadas de humanos e animais foram derrubados e criou-se a União. O mesmo é verdade acerca das posteriores comunidades agrícolas, as quais viram os ciclos de vida e morte dos humanos refletidos nos ciclos das colheitas.”.
Joseph Campbell, Primitive Mythology

Os Mistérios Masculinos surgiram do culto matrifocal do período neolítico. Baseiam-se na formação de cultos de caçadores e guerreiros necessários à sobrevivência do clã como um todo. Esses subcultos não sofreram influência das mulheres do clã, que permaneciam nas aldeias enquanto os homens estavam longe, caçando ou lutando contra inimigos. Eram períodos nos quais os homens estavam as sós e juntos, longe das responsabilidades da comunidade familiar ou da aldeia. Assim, livres das restrições da estrutura social estabelecida pelas mulheres, os homens desenvolveram uma subcultura própria, refletindo seus desejos e necessidades exclusivamente masculinos.
A Tradição Misteriosa Masculina pode ser dividida em até quatro categorias: o Caçador-Guerreiro, o Sátiro, o Rei Divino-Deus Sacrificado e o Herói. Esses mistérios associados aos homens resumem bem os aspectos da mentalidade e do comportamento masculinos. Assim, podemos separar a maioria dos homens em uma ou mais das categorias acima. Como ocorre com todas as generalizações (e estereótipos), esse aspecto comportamental ou de mentalidade não se aplicam a todos os indivíduos.
Iniciações envolvendo teste de bravura, força física, resistência ou tolerância à dor eram aspectos de iniciação nos antigos cultos masculinos. Eram traços essenciais para a sociedade masculina. Principalmente em razão do fato de que a caça de animais era perigosa, os inimigos eram comuns, as lutas inevitáveis e os ferimentos físicos esperados. Assim, no início da puberdade, quando os hormônios magicamente transformam garotos em homens, tinha início os primeiros ritos de masculinidade.
O primeiro passo nessa iniciação transformativa era encontrar-se com o Monstro (o que quer que isso represente a uma certa comunidade). Há uma antiga lenda que envolve um clã cuja aldeia estava sujeita aos horríveis sons de um monstro habitando nos bosques ao redor. Somente os guerreiros/caçadores abandonavam a segurança da aldeia, e mesmo assim armados até os dentes. Os restantes ouviam amedrontados os sons da incrível criatura. Os homens geralmente voltavam trazendo descrições apavorantes desse perigoso monstro.
Quando um garoto atingia a puberdade, ele devia seguir os homens pelos bosques e encarar a criatura. Durante a jornada, os homens gradualmente desapareciam entre as árvores sem serem percebidos, até que o garoto ficasse na companhia de apenas deles, seu iniciador. Quando se aproximavam do local de onde emanavam os sons, o garoto recebia uma lança; a seguir o homem apanhava-o pelo braço e, bradando um grito de guerra, corria impelindo o garoto rumo à clareira para atacar a criatura. No centro da clareira, um homem soprava um enorme chifre de onde emanavam os horríveis urros do monstro. O garoto havia então matado o monstro de sua infância e se tornara um homem.
Era prático dos Mistérios Masculinos criar histórias de bosques assombrados e monstros terríveis. Serviam não só no exemplo acima, mas também para assegurar locais rituais privativos. Isso foi particularmente importante durante a inquisição. O aldeão comum não desejava ingressar em bosques onde forças sobrenaturais estivessem em ação.

O Caçador-Guerreiro

Os primeiros clãs humanos sobreviveram graças, em grande parte, aos caçadores e guerreiros da tribo. Caçava-se o gamo, que fornecia alimento, agasalho e instrumentos confeccionados com cifres e cascos. O alce se tornou um símbolo de provisões, e na sua natureza de líder e protetor da manada, os caçadores primitivos identificaram algo do próprio clã. A rivalidade entre os alces pelas fêmeas era, em muitos aspectos, simbólica das paixões com que os próprios homens lutavam. Entre os gamos, o homem primitivo vislumbrou seus próprios instintos sexuais e de liderança unidos no fervor da caçada (atualmente, diversos esportes suprem essa importante função social nos homens). Ao observar os alces afastando os predadores com golpes de suas galhadas, o homem aprendeu como utilizar a lança. Da íntima relação entre o caçador e a caça, surgiu uma certa reverência e identidade espiritual. Os homens foram provavelmente os primeiros a sigilar conceitos, o rastro de um animal passou a simbolizar esse animal; ver esse símbolo significava a possibilidade de ver o próprio animal (o protótipo da evocação). Ao reverter o processo, cria-se o símbolo e, portanto, cria-se a possibilidade de ver o animal a ele associado. Dessa associação primitiva surgiu o pensamento mágico, e vemos que os antigos entalhes e pinturas rupestres visavam evocar a presença de vários animais de caça.
Em tempos remotos, o membro mais valente e mais forte do clã assumia uma posição elevada no culto do caçador-guerreiro, assim como o grande alce entre seu harém de fêmeas. Esses eram os atributos mais importantes para assegurar sucesso na caça e na luta. Trajando peles e os chifres de sua presa, o poder primitivo passava e seu espírito e ele se tornavam o Mestre dos Animais, Senhor da Floresta. Um dos mais interessantes aspectos dos Mistérios do Caçador-Guerreiro concerne aos códigos de conduta formada numa sociedade basicamente violenta. À medida que o homem se tornava menos bárbaro, estabelecia várias regras, principalmente relacionadas às lutas. Incluem-se aqui regras acerca do tratamento dispensado aos prisioneiros, quando um inimigo desarmado podia ou não ser morto, e assim por diante. Tal código de honra pessoal tornou-se a pedra fundamental das sociedades masculinas.
Um homem que fosse respeitado por sua capacidade física e suas habilidades em combate perderia rapidamente o respeito dos demais se demonstrasse falta de honra. Isso assinalou um período no qual o homem interior era mias importante do que o exterior. Um exemplo moderno seria o herói do esporte que demonstra pouco espírito esportivo em campo. A verdadeira força de um homem não está em sua força física, mas em seu controle pessoal. Saber quando não empregar seus atributos físicos (direta ou indiretamente) é a marca de um homem de honra. Exemplos disso são a violência física e psicológica a crianças e mulheres.
Atualmente é comum ver os homens como um patriarcado maligno que nada mais fez além de erradicar os antigos cultos da Deusa, e que continua a subjugar conscientemente as mulheres. Contudo, isso não reflete a duradoura tradição dos Mistérios Masculinos, e os homens geralmente demonstram um sacrifício impessoal por outros, especialmente os oprimidos e todos aqueles que não são capazes de se defender. O melhor exemplo é o código de cavalheirismo assumido por um cavaleiro. Apesar da opinião moderna de certos grupos políticos, o verdadeiro homem não oprime ou abusa das mulheres. É, no entanto, natural aos homens competir e manter papéis de liderança social, um fruto dos antigos impulsos que originaram os primeiros cultos ao Caçador-Guerreiro.
O combate é uma experiência que, apesar não ser exclusiva ao homem, é vivida por uma porcentagem muito maior de homens do que de mulheres. Na sociedade moderna, é um período no qual os homens podem chorar e se abraçar sem a desaprovação social. No combate, os homens voluntariamente sacrificam suas vidas pela de um amigo, na defesa de usa nação ou de seus princípios e crenças. Essa é a verdadeira nobreza do homem, surgida de seu eu interior em meio ao caos e o medo. Entretanto, também é verdade que na guerra são cometidas atrocidades, e também isso tem origem na natureza humana. É importante compreender que não se trata de comportamento instintivo; é a manifestação de ódio, preconceito, frustração e vingança. Deve ser cuidada e cultivada, ao contrário dos traços nobres que são inerentes a nossas almas.
Há uma certa especulação sobre os sentimentos de raiva e ressentimento com relação às mulheres, que teriam surgido nas sociedades patriarcais durante a transição de caçador-coletor para agrícola. Foram às mulheres que estabeleceram o mito do Deus Sacrificado envolvendo os homens. As antigas formas divinas do Mestre dos Animais e Senhor da Floresta deram lugar aos deuses com pés de bode e Senhores da Colheita. As mulheres mantiveram as estruturas religiosas, organizando e dirigindo a vida doméstica das pessoas da aldeia, e os homens começaram a trabalhar nos campos. Onde antes o homem era o grande caçador, agora ele caminhava por entre canteiros, plantando sementes. Onde antes ele arremessava sua lança contra a presa, agora rasgava a terra com seu cajado.
Alguns historiadores e arqueólogos crêem que bandos de guerreiros nômades saíram em cruzada contra os cultos matrifocais, numa tentativa de destruí-los (uma teoria amplamente refletida na obra de Marija Gimbutas). É mais provável que as tribos patriarcais simplesmente tenham se expandido em regiões mantidas por sociedades matrifocais como conseqüência de alterações climáticas, crises de fome e/ou falta de caça. Seria o caso dos indo-europeus, conhecidos como belicosos, e que simplesmente apanhavam aquilo que desejavam e necessitavam, dominando toda e qualquer resistência por meio da espada. É pouco provável que as sociedades matrifocais não possuíssem armas ou a habilidade de utilizá-las quando necessário, mas no fim elas acabaram por não ser páreo para os exércitos invasores, e sua cultura foi absorvida pelos conquistadores. Os conceitos e ícones religiosos dos vencidos foram substituídos pelos dos vencedores, pois, segundo uma antiga lógica, os deuses que propiciam a vitória devem ser mais poderosos do que os que permitem a derrota.
O Sátiro
As antigas imagens do sátiro e do centauro simbolizam a divisão no interior do homem entre sua natureza mais elevada e a mais baixa. A metade inferior do corpo, animalística, representava a natureza sexual e o desejo de ser indomável ou sem restrições. A parte superior da figura representava seu intelecto e sua natureza espiritual, buscando equilibrar e governar seus instintos e desejos básicos. Para muitos homens modernos, esse ainda é o dilema em que se encontram. Os homens lutam contra o que os psicólogos chamam de libido ou Id. Esse desejo básico está ligado aos três instintos fundamentais: autopreservação (instinto de sobrevivência), reprodução (instinto sexual) e companhia (instinto de grupo). Ao contrário dos outros animais, a humanidade aparentemente fundiu esses três instintos num quarto, o instinto religioso. É por intermédio da religião que os humanos vêm desenvolvendo maneiras de lidar com seus medos e desejos naturais.
Na sociedade moderna, os instintos masculinos foram canalizados em esportes e outras formas de competição. Em tempos remotos, estavam incorporados a rituais que fortaleciam a terra e a comunidade. Esses ritos, assim como os impulsos sexuais dos homens, eram controlados e dirigidos pelas mulheres. Muitas mulheres atualmente ainda tentam controlar os instintos sexuais dos homens ao protestar contra as revistas e vídeos masculinos. Os homens são inerentemente visuais quanto ao estímulo sexual. Caminhos mentais se formaram há muito tempo nessa área, derivando da exposição natural dos órgãos genitais femininos antes que o homem fosse uma criatura ereta. Os genitais emitiam sinais sexuais, alguns deles associados ao sangramento menstrual. A posição de coito normal era a entrada por trás, a qual necessitava de concentração visual. A fêmea, face voltada para longe da atividade, formava trilhas menta onde precisava mais da imaginação do que da visualização real para se estimular sexualmente. Atualmente, os homens sentem atraídos por seios fartos e lábios vermelhos, reminiscências das nádegas e da vagina expostas quando vistas por trás.
Em tempos remotos, as mulheres não associavam o prazer sexual de um homem num ritual a algo negativo. Seu sêmen era mágico e gerava vida; portanto, era empregado como um dos sagrados fluidos rituais e cerimoniais. Infelizmente, muitas pessoas hoje consideram um ritual que inclua prazer sexual aos homens como algo perverso, manipulativo ou abusivo para as mulheres. Essa repressão do poder dinâmico inerente aos homens criou uma fissura entre as mentes consciente e inconsciente. Assim, a imagem de um sátiro simboliza o homem perdido entre sua natureza elevada e inferior. Em alguns casos, isso pode se manifestar num homem na forma de uma incapacidade de compreender seus próprios sentimentos, o que o leva a buscar válvulas de escape físicas para manter ou descobrir seu senso de identidade.

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